Pena e Compaixão



Mesmo sabendo que são palavras que o Aurélio nos apresenta como sinônimas, vou tentar aqui distinguí-las, sem, no entanto, criar também uma nova regra para a língua portuguesa. Como pressuposto utilizo o entendimento que formulei a partir do uso coloquial das expressões.
Entendo a compaixão como sentimento mais nobre que a pena. Quem sente pena apenas concebe a existência do sofrimento alheio e, por vezes, concebe também a sua inferioridade. Quem sente compaixão sofre com o sofrimento alheio, incomoda-se com ele, não enxerga no outro a inferioridade e sim a necessidade que tem de ser ajudado. Aquele que sente pena tenta, mesmo que não perceba, se engrandece, se tornar superior diante da situação alheia de inferioridade. 
A partir daqui já se pode perceber a falta de nobreza do sentimento da pena, que muitas vezes trás consigo uma certa felicidade. Felicidade que surge com a constatação do sofrimento alheio. Muitos não a percebem, outros a deixam transparecer.
É certo também que existem aqueles que encontram a felicidade sempre que ajudam os outros, mas há que se distinguir a felicidade que surge com a percepção da melhora da situação alheia com aquela que surge com a simples demonstração de “poder” de quem ajuda. Há aqueles que se sentem felizes e engrandecidos diante da demonstração de solidariedade que deram, sem, no entanto, estarem verdadeiramente preocupados com as conseqüências do que fez.
É por isso que não vejo com bons olhos toda e qualquer ação de solidariedade. Muitas delas se prestam apenas à satisfação momentânea de quem ajuda, porque se engrandece com ela. Entidades religiosas e políticas se engrandecem com demonstrações de caridade que não possuem em essência nenhuma demonstração de compaixão. E todos nós sabemos o porque dessas ações.
Admiro mais a postura daqueles que, cientes das leis de ação e reação, preferem interferir no alheio apenas quando intimamente tocados, desconhecem o sentimento da pena, mas se compadecem com aqueles que amam e com outros que por ventura venham a amar. Admiro ainda mais aqueles que não restringem seus atos de amor aos que lhe são próximos, compadecem-se com aqueles que necessitam de ajuda, doam-se por completo.
Esses, quando morrem, costuma-se chamá-los de santos – é o que, por exemplo, aconteceu com Chico Xavier - o que pra mim não passa de grande afronta, seus atos não podem ser comparados aos dos santos de antigamente, a história nos conta sobre o porque das santificações, mas não cabe aqui discutir-se isso. O que se sabe é que a nossa sociedade, culturalmente influenciada pelo catolicismo, prefere ainda valorizar aquele que sente pena, e enxerga com maus olhos o que se mantém mais rijo diante de certas situações e age apenas quando tomado pelo sentimento da compaixão.
Obviamente, aquele que trabalha em prol dos outros, seja buscando o benefício próprio ou beneficio alheio, já está indo num bom caminho, mas fundamental é perceber o que, em verdade, cada um precisa. A experiência da dor é fundamental à evolução moral do indivíduo. Defendo a idéia de que o que se aprende com os próprios erros é muito mais válido do que o que se aprende com a observação. Por isso é fundamental que aquele a quem se quer ajudar, tenha, de antemão, se disposto a ser ajudado. Não só para não desperdiçar energias, mas também para não atrapalhar a sua evolução. Pobre daqueles que acreditam que se ganha créditos com Deus sempre que se ajuda alguém. Se isto é feito só por um sentimento de pena, ou objetivando o auferimento do referido crédito, é lógico que os efeitos desta ação não vão ser os mesmos daqueles que resultam do sentimento da compaixão.
Há aqueles também que auxiliam o próximo apenas por uma necessidade de desencargo de consciência. Acreditam haver necessidade em sentir-se pena dos outros. O que é totalmente desprovido de lógica, deve-se, na verdade, buscar-se o sentimento da compaixão, sem forçá-lo, não há compaixão na artificialidade. Não age com compaixão aquele que faz pelo prazer próprio, não age com compaixão aquele que ajuda para demonstrar que pode ou para se inflar de orgulho e dizer: eu também ajudei.
Deve-se, portanto, buscar-se agir com compaixão. Até mesmo a mais simplória das doações deve ser gerada a partir deste nobre sentimento. Sentir compaixão é doar ao próximo um pouco de si mesmo, é reservar lugar para ele entre os seus pensamentos, é dividir a angústia e os sofrimentos e, por fim, felicitar-se junto com o outro pelo seu engrandecimento.

Bruno Sampaio
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